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  • Foto do escritorNatália P. de Castro

O que fazer para melhorar a alimentação do meu filho com Transtorno do Espectro Autista (TEA)?




Hoje é véspera de Páscoa, numa semana que é especial para a gente, por ser aniversário de 5 anos do NutS. Por isso, não poderíamos fazer diferente: trouxemos conteúdo necessário, que pode ser muito útil para alguns de vocês.


Vamos falar, pela primeira vez, do Transtorno do Espectro Autista (TEA) e de como a alimentação pode ser afetada em crianças que receberam este diagnóstico. Também oferecemos dicas do que fazer para driblarmos o problema de alimentação das nossas crianças com TEA.


O que é o Transtorno do Espectro Autista (TEA)


O autismo é um complexo problema neurocomportamental, caracterizado pelas deficiências na interação social recíproca e comunicação, e presença de comportamentos, interesses e atividades repetitivas. O início dos sintomas geralmente ocorre antes dos 3 anos de idade. A severidade dos sintomas, bem como o padrão de deficiências observadas, varia de indivíduo a indivíduo e, por isso, ao conjunto dessas desordens é dado o nome de “espectro” de desabilidades.


A deficiência na interação social pode abranger a dificuldade de iniciar e manter uma interação, dificuldade de reconhecer experiências e emoções e dificuldade de processar e apreciar os pensamentos e sentimentos dos outros. A deficiência na comunicação pode ir desde a ausência de formas úteis de se comunicar à linguagem avançada, com extenso vocabulário, mas pouca ou nenhuma habilidade de usar a linguagem socialmente. Os comportamentos repetitivos e estereotípicos podem incluir rituais complexos, extrema dificuldade de se adaptar às mudanças e movimentos pouco usuais, como sacudir e girar as mãos.


Antes considerada rara, hoje, estima-se que 1 em cada 59 crianças tenha TEA. O TEA tem início antes dos 3 anos de idade e, apesar de durar toda a vida, é possível observar melhora dos sintomas com o passar do tempo. Algumas crianças apresentam sintomas de TEA nos primeiros 12 meses de vida, enquanto outras podem apresentar sintomas apenas após os 2 anos. Algumas crianças podem adquirir novas habilidades e atingir todos os marcos do desenvolvimento dos 18 e 24 meses. Depois, essas crianças param de adquirir novas habilidades e podem perder as habilidades adquiridas.


Quando adolescentes e jovens adultos, as pessoas com TEA podem ter dificuldades em fazer e manter amizades, comunicar-se com colegas e adultos, ou de entender quais são os comportamentos esperados na escola e trabalho. Geralmente, as pessoas com TEA também chamam a atenção dos profissionais de saúde por desenvolverem outras condições, como ansiedade, depressão ou transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), que são mais frequentes nas populações com TEA que nas populações que não tem o TEA.


O Transtorno do Espectro Autista (TEA) e alimentação


As queixas mais frequentes dos pais de crianças com TEA em relação a alimentação são:


· “Meu filho só come comida em temperatura ambiente”.

· “Meu filho só come comida crocante”.

· “Meu filho só come nuggets de redes de restaurantes fast food”.


Pela alta seletividade alimentar das crianças com TEA – a prevalência da seletividade alimentar entre estas crianças está entre 46 a 89%, ao passo que apenas 10 a 35% das crianças sem o diagnóstico apresentam seletividade alimentar, tendemos a acreditar que elas estão em risco para a desnutrição. Aliás, foi mostrado que crianças com TEA, em idade escolar, consomem duas vezes menos lacticínios, proteínas, frutas e verduras que as crianças sem esse diagnóstico (Schreck, Williams & Smith, 2004). Também foi relatado pelos pais de crianças com TEA, que elas têm preferências por texturas, elas podem só aceitar alimentos apresentados de uma determinada forma, as vezes têm preferência por utensílios e pratos específicos. Outros estudos mostram que metade das crianças com TEA não comem a mesma refeição da família (Collins et al., 2003).


No entanto, em revisão sistemática e metanálise (Zheng et al., 2017), mostrou-se que a prevalência de obesidade em pessoas com TEA é quase 2 vezes maior que a população sem este diagnóstico. Por quê?


· Em primeiro lugar, a seletividade e hábitos dietéticos específicos fazem com que as intervenções nutricionais sejam mais desafiadoras.


· Em segundo lugar, as pessoas com TEA dispendem menos tempo em atividade física e dedicam mais tempo às atividades sedentárias. Pessoas com TEA também têm mais dificuldade de participar de programas de prevenção da obesidade, por questões comportamentais.


· Em terceiro lugar, pessoas com TEA possuem maior risco de usarem medicações antipsicóticas, as quais estão associadas com aumento de peso.


· Em quarto lugar, as pessoas com autismo têm maior risco de apresentarem comorbidades associadas à obesidade, como problemas para dormir, problemas gastrintestinais e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).


· Finalmente, há estudos que apresentam que pessoas com TEA, possuem duas microdeleções, em 16p11.2 ou 11p14.1, genes relacionados a suscetibilidade a obesidade.


Portanto, apesar da seletividade alimentar e da nossa preocupação enquanto pais, não devemos liberar uma alimentação restrita a nuggets, porque é a única coisa que o nosso pequeno com TEA come.


Como promover essa mudança na alimentação?


Antes de mais nada, devemos lembrar que não será um processo simples, mas muito importante.

Há apenas um jeito de melhorarmos a alimentação dos nossos pequenos com TEA: apresentarmos repetidamente novos alimentos. Mas há formas para que isso seja mais bem recebido pelos pequenos:


1) Apresentar sabores diferentes em porções ínfimas – estamos falando na textura de farelos e porções muito pequenas. O melhor é começar com alimentos que tenham sabor ou textura similares ao que a sua criança já come, bem como alimentos que seu filho já comeu, mas que hoje não come mais. Algumas vezes, é mais fácil começar com alimentos que não requerem mastigação, como iogurte ou purês, para reduzir a chance do seu filho guardar o alimento na boca e, em seguida, cuspir. Também pode ajudar deixar com que seu filho tome um gole de sua bebida preferida após engolir o alimento nas primeiras exposições àquele novo sabor.


2) Desaparecimento do estímulo – aqui falamos de aumentar o tamanho dos alimentos oferecidos, de farelo para tamanho de ervilha, uma vez que seu filho estiver aceitando aquele novo sabor apresentado. Considera-se aceitar, quando a criança come pelo menos 3 porções pequenas daquele alimento, em intervalos menores que 30 segundos, sem chorar, gritar ou espernear.


3) Reforço positivo para aceitação de novos sabores e para comportamento apropriado durante as refeições, na forma de elogios verbais, bem como acesso aos alimentos preferidos, brinquedos e atividades (reforçadores), reservados e disponibilizados apenas para quando a criança aceitar novos alimentos. Recomenda-se restringir o acesso da criança aos reforçadores, para impedir que eles deixem de motivar o seu filho.


4) Deve-se planejar ignorar o mau comportamento da criança nas refeições. Isso é dificílimo de fazer, principalmente quando se despende tanto tempo no preparo da refeição do seu pequeno. Enquanto a criança grita e chora, deve-se ignorá-la, mesmo que difícil. Com o tempo, ignorá-la durante o mau comportamento, reduzirá esse comportamento da criança. Vale dizer, que antes de melhorar, é possível que o comportamento dela piore nesse começo, o que irá exigir bastante paciência.


5) Previna a fuga, não removendo a comida nova quando a criança exibir problema de comportamento (empurrando o prato de comida ou gritando) e sempre faça com que a criança aceite pelo menos uma única colherada/porção da comida apresentada antes de poder deixar a mesa.


6) Planeje a alimentação do seu filho, para eliminar as escapadas entre as refeições. Isso, irá aumentar o apetite do seu filho e o motivará a comer durante as refeições.


Quando for começar a implementar esse plano novo para o seu filho, faça uma planilha de excel, com os alimentos já experimentados, tamanho da porção oferecida, número de colheres que foram aceitas e reação do seu filho à cada alimento apresentado. Isso ajudará a ter melhor controle das refeições.


Recursos visuais


Muitos pais de crianças com TEA, preocupam-se em promover essas mudanças na rotina de alimentação, pela baixa compreensão do seu filho. Por isso, o uso de recursos visuais tem sido importante para promover independência e reduzir os problemas comportamentais causados pela mudança na rotina de alimentação.


· Use tabelas para mostrar ao seu filho como as refeições e lanches serão distribuídos ao longo do dia.


· Use uma tabela com adesivos, indicando quantos pedaços/porções/mordidas precisam ser comidas antes da criança receber sua comida preferida ou brinquedo.


· Uma lista detalhada, com fotos ou desenhos, mostrando quais comidas serão apresentadas e em qual ordem da refeição ela será apresentada.


Quando for modificar a rotina de alimentação do seu filho, antes de introduzir os alimentos, comece implementando o reforço positivo quando ela se comportar bem, apresentar alimentos já conhecidos em tamanhos menores (farelos), e estabelecendo um tempo mínimo de permanência na mesa. Após estabelecidos esses passos iniciais, a criança começará a se sentir mais confortável na rotina, o que pode ajudá-la a experimentar novos alimentos.


Abaixo, seguem as sugestões de organização da iniciativa "broccoli boot camp", disponível em: https://bitesfeedingtherapy.com/broccoli-boot-camp-resources/


1 - Planilha - exposição a novos alimentos

2 - Planilha de reação aos sabores diferentes

3 - Planilha para cada refeição



Apesar de difícil para muitos pais, a boa notícia é que é possível melhorar a alimentação do seu filho com TEA, ainda que seja necessário persistência.


Referências


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